quinta-feira, 1 de julho de 2010

HERESIAS MEDIEVAIS, de Nachman Falbel – PARTE 5

image E vamos com a quinta parte desta série sobre as heresias medievais. Aqui ficamos sabendo que a violência do combate às heresias não começou na cúpula da Igreja e sim com o povo, tão adorado pelas elites atuais. A heresia valdense também dá as caras.

Qual a base da violência no combate às heresias?

A base era popular. A própria existência da heresia é, sem dúvida, sinal demonstrativo da vida religiosa dos tempos medievais. Por isso, não se deve estranhar a violência gerada no combate a ela. Nem sempre o extermínio dos heréticos cátaros era executado por funcionários que deviam justiçá-los, mas por iniciativa do populacho fanatizado que não tolerava a heresia “filha de Satã”.

Qual a atitude da Igreja perante a heresia?

Primariamente, a de tentar converter os heréticos à fé católica, só adotando uma atitude agressiva e o uso da violência quando nada se conseguia no primeiro caso. A violência popular era condenada pela Igreja. Vemos estas tendências nas palavras de São Bernardo, escritas ao papa após o massacre de Colônia:

O povo de Colônia passou da medida. Se aprovamos o seu zelo, não aprovamos, de modo algum, o que fez, pois a fé é obra de persuasão e não podemos impô-la.

No que a Igreja se baseava para usar o poder temporal de perseguir, julgar e exterminar heresias?

Baseava-se na teoria das “duas espadas” do Papa Gelasius, que afirmava que Deus havia dado o poder temporal e espiritual ao papa que, por sua vez, entregara o poder temporal aos reis, monarcas e príncipes para proteger a fé. Em última instância, a heresia que visava atacar a cátedra de São Pedro, o papa, era perigosa não só do ponto de vista religioso dogmático, mas também sob o aspecto da unidade política do mundo cristão.

Quem fundou a heresia valdense?

Foi o rico comerciante Pedro Valdo ou Valdes de Lyons que, segundo o testemunho do Anônimo de Laon, ficou profundamente abalado pela leitura das Escrituras Sagradas, por volta de 1173. Ele traduziu o Evangelho para o provençal e rom­peu todos os vínculos com o mundo, confiando seus bens à esposa e na carestia de 1176 doou o restante de seu património aos pobres. Passaram a segui-lo homens e mulheres que praticavam a instrução do Evangelho, vagando pelas estradas dois a dois, em pobreza apostólica, vestidos com simples buréis, pre­gando a penitência. O movimento difundiu-se rápida e extensamente, alcançando os Humilhados da Lombardia, uma confraria de artesãos (tecelões) que se associaram por objetivos econômicos e religiosos na primeira metade do século XII. Grande parte deles ligou-se aos valdenses, com os quais foram excomungados pelo Papa Lúcio III.

A seita valdense conseguiu se manter unida?

Não. Os valdenses lombardos queriam ter, malgrado a oposição de Valdo, a eleição e a ordenação de seus próprios pastores e conservar as suas próprias associações de artesãos, isto é, a prática do trabalho manual remunerado. Assim, em 1210, houve uma ruptura que continuou ainda depois da morte do funda­dor, em 1217. Enquanto os valdenses da França, con­finados em grande parte no Languedoc, na Provença e no Delfinado, mantinham, apesar de suas doutrinas heréticas, certo liame com a Igreja Católica e participavam de sua liturgia, os valdenses italianos passaram à mais agressiva oposição, negando a validade dos sacramentos administrados por sacerdotes católicos e instituindo um serviço litúrgico próprio. Este ramo lombardo desdobrou-se numa grande atividade e, va­lendo-se de uma propaganda clandestina ativa, conse­guiu difundir-se não só no Piemonte e na Sabóia, mas também na Alemanha Meridional e Oriental, na Boé­mia, na Morávia, na Polónia, na Hungria, na Itália Meridional, conquistando muitos adeptos. A Inquisição teve muito trabalho com eles até a época do Renascimento. Muitos valdenses foram leva­dos à fogueira e outros reconquistados pela persuasão pacífica.

O que declarava a heresia valdense?

Declarava que a Igreja fora pura e incorrupta até a época de Constantino, quando o Papa Silvestre ganhou a primeira possessão temporal para o Papado, começando, assim, o sistema de uma Igreja rica, poderosa e temporal, tendo Roma como sua capital.

O inquisidor Sacconi dividia-os em duas classes: os do Norte dos Alpes e os da Lombardia.

A primeira classe assegurava, entre outras coisas, que:

1) os juramentos são proibidos pelo Evangelho;

2) a pena capital não é permitida ao poder civil;

3) todo leigo pode consagrar o sacramento do altar;

4) a Igreja Romana não é a Igreja de Cristo.

A seita lombarda assegurava que nenhum pecado mortal poderia consagrar o sacramento, e que a Igreja de Roma era a mulher marcada do Apocalipse, cujos preceitos não deveriam ser obedecidos, especialmente os apontados como dias de jejum. Diferentemente dos cátaros, opunham-se ao ascetismo e não tinham um sacerdócio oficial; mas, ao mesmo tempo, aproximavam-se deles por serem também contrários aos juramentos e à pena capital.

Os valdenses, apesar das perseguições permanentes que sofreram durante toda a Idade Média, conseguiram, como se sabe, sobreviver até os nossos tempos.

Quais as características dos pseudo-apóstolos ou apóstolos de Cristo?

Um dos traços da doutrina dessa heresia manifestou-se no ataque aberto e direto ao Papado, exigindo a limitação de seu poder. Os apóstolos de Cristo também afirmavam que após a época do Papa Silvestre a Igreja abandonara o gênero de vida dos primeiros santos, exceto o Frade Pedro de Morrone, fundador dos celestinos, que mais tarde, a 5 de julho de 1294, tornou-se o Papa Celes­tino V. Desde o início usavam cabelos longos, uma túnica branca com uma pelerine da mesma cor presa no pes­coço. Seus adeptos deviam percorrer o mundo descal­ços ou de sandálias, mendigando como os pobres, vivendo de esmolas e pregando ao povo:

Fazei penitência, pois o reino dos céus está próximo (Mt. 3.2).