terça-feira, 22 de julho de 2008

A OSTRA E O VENTO, de Moacir C. Lopes

Talvez você tenha visto o filme baseado no romance. Ou no cinema ou no Canal Brasil. O roteiro foi escrito por Walter Lima Jr, o diretor, e Flavio Tambellini. E desde já fica aqui a minha admiração pela dupla, pois adaptar este romance não é uma das tarefas mais fáceis.

Começa pelo narrador. Ele não é estático. Ora é uma personagem, ora outra. E a primeira coisa que precisamos definir ao escrevermos um roteiro é: quem, caralhos, vai contar a história? De quem será o ponto de vista? Infelizmente, não assisti ao filme completo. Vi um pequeno trecho e não sei qual foi a solução que os roteiristas encontraram. De qualquer forma, tenho a plena certeza de que litros e litros de café foram usados nas discussões sobre a adaptação.

Bom, agora o livro.

O velho Daniel volta à Ilha dos Afogados onde trabalhara como auxiliar de faroleiro e não encontra os únicos moradores do local: José, o responsável pelo farol, Marcela, a filha única de José e Roberto, um jovem coxo, substituto de Daniel. Eles morreram? Fugiram? Houve um crime? Nada se sabe. Mas através de uma prosa altamente poética, vamos aos poucos nos enfronhando no passado do lugar.

José é um homem fechado, que praticamente se exilou na ilha para escapar das lembranças de Joana, sua mulher, que fugiu com outro homem. Seu amor por Marcela, sua filha, é asfixiante, possessivo. À menina, só resta fantasia. E ela se apaixona pelo vento, ao qual dá o nome de Saulo. A relação de Marcela com Daniel é comovente. Ele a ensina e ler e a escrever. E tenta esquecer da morte de sua mulher e de seu filho:

"O aviso aos navegantes: luz apagada temporariamente, luz que era sua vida. Na outra ilha, para onde seguiu, morreu o filho. Hoje são duas cruzes, uma em cada ilha, cicatrizadas."

Mesmo assim, é o velho Daniel quem passa mais tempo convivendo com Marcela. E alerta José:

"(...) fazer da solidão uma vingança é perigoso, destrói, só podemos entender a solidão quando somos livres, (...)"

A situação fica complicada na ilha com a chegada de Roberto, com quem Marcela pensa até em se engraçar, mas desiste. Ela é tocada pelo vento, por Saulo, que faz as vezes de narrador da história em algumas passagens do livro. José fica de olho nos dois, com medo que a filha se entregue a Roberto.

Moacir C. Lopes não é um dos autores mais badalados do país. Seu estilo pode parecer enfadonho para alguns. É muito detalhista em alguns trechos, mas o livro é de uma delicadeza ímpar. Também fazem parte de sua obra os romances "Maria de cada porto", "Por aqui não passaram rebanhos", "Chão de mínimos amantes", entre outros.

A música-tema, "A ostra e o vento", é de Chico Buarque, que cita o "namorado erradio" da protagonista da história. Na caixinha de música abaixo, você pode ouvi-la na íntegra. Participação especial de Branca Lima.