sábado, 27 de setembro de 2008

MEDIDA POR MEDIDA, de William Shakespeare

Coluna do Diogo Mainardi desta semana em Veja:

"Em momentos de incerteza, como este, o melhor a fazer é recorrer a William Shakespeare. Está tudo ali: o passado, o presente, o futuro."

E é verdade.

Lendo "Medida por medida" vemos que ali está a primeira crítica contra prisões espetaculosas, dessas realizadas pela Polícia Federal. Está no primeiro ato, cena II. Angelo, substituto temporário do Duque de Viena, manda prender Claudio - que deve servir de exemplo para todos os moradores da cidade. Claudio se espanta com o aparato que Angelo preparou:

- Meu amigo, por que me ofereces assim em espetáculo ao público? Leva-me para a prisão para onde fui mandado!

E o preboste responde:

- Não estou fazendo com má intenção, mas por ordem especial do Senhor Angelo.

Angelo é Tarso Genro. Claudio, guardadas as proporções, é Daniel Dantas ou Pitta ou Nahas... A escolher.

Quase tudo em "Medida por medida" lembra o PT. Afinal, não era este o partido que iria mudar tudo isso "que está aí"? Assim também acontece com Angelo. Ele é chamado pelo Duque de Viena para tomar conta da cidade. Angelo é um homem duro, implacável, e que estava firmemente disposto a acabar com a corrupção. Mas é só ter aquele contatozinho básico com o poder que acaba comentendo o mesmo crime pelo qual condenaria Claudio à morte: fornicação.

Mas é claro que não podemos diminuir Shakespeare fazendo comparações com o PT. Há um diálogo primoroso entre Claudio e sua irmã, Isabel, que é uma noviça. Se eu pudesse resumir numa expressão este trecho da peça, não teria a menor dúvida em cravar: crueldade da virtude. A condição para que Claudio possa ser poupado do machado do carrasco é entregar-se à Angelo. E ela diz: "Isso eu não faço", para desespero do irmão:

"O resgate pela ignomínia e o livre perdão são duas coisas diferentes. A legítima clemência não é parenta da redenção vergonhosa."

E há uma fala sensacional de Escalo, assessor de Angelo:

"Uns sobem à custa do pecado, outros caem por causa da virtude; alguns saem de uma selva de vícios sem ter que prestar contas de nenhum deles e os outros são condenados por uma única falta."

Mais PT, impossível. Mais Brasil, impossível.