quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

DOM CASMURRO, de Machadão

Capitu pulou a cerca – não tenho a menor dúvida. Bentinho queria um filho e ela não engravidava nem a pau (sem trocadilhos). De repente, ela pega barriga, o garoto nasce e é a cara de Escobar, que costumava freqüentar a casa quando o dono não estava. Não é demais lembrar que Capitu, desde a mais tenra adolescência era dissimulada. Em qualquer situação de perigo, ela disfarçava muito bem, para espanto de Bentinho.

Certo: Bentinho é ciumento. Tem ciúme “até dos mortos”, segundo Capitu. Acontece, como bem lembrou Diogo Mainardi, o livro não é escrito no calor dos acontecimentos. Há o distanciamento do tempo, que permite ao narrador ter a frieza necessária para analisar os fatos. E isso não o faz sequer negar que, sim, a imaginação lhe pregava peças.

Só que Machado, qual um autor de romance policial, tenta despistar o leitor. Num capítulo, o pai de Sancha diz que é incrível como certas pessoas se parecem mesmo que não tenham o menor parentesco. Pegadinha, claro. Anos depois, Bentinho vê a incrível semelhança entre Ezequiel, seu suposto filho, e Escobar, seu grande amigo. Não pode ser ilusão de ótica a descrição que Bentinho faz de Ezequiel pouco antes da morte deste: é Escobar. Simplesmente Escobar.

Bom, já cansei de dizer que, como Nelson Rodrigues, sou um septuagenário nato. Machado me traz o Rio antigo, do século XIX, que mais parecia um bairro qualquer, gigante, onde praticamente todos se conheciam. Bentinho morava, quando criança, na Rua de Matacavalos – é a atual Rua do Riachuelo. Machado me traz o mar batendo no outeiro da Glória – tomado pelo Aterro, obra sem a qual o Rio de Janeiro seria impraticável, bem sei. Machado me traz seges, me traz chapéus, me traz, enfim, uma outra cidade.

De todo o romance, tiro uma conclusão: Deus castiga! Se Bentinho não tivesse rompido a promessa feita por sua mãe colocando um órfão no seu lugar, sua cabeça não teria sido ornada por chifres... Hehehe...

No mais é ler. E depois reler.

Mata_cavalos

Ilustração da Rua de Matacavalos que tinha este nome

por ter um piso irregular no qual os cavalos acabavam se ferindo.