O samba, é claro, tem a cara do Rio e dizer isso é chover no molhado. E isso não poderia ficar de fora do livro de Brasil Gerson, mas com uma curiosidade. É sabido que o primeiro samba gravado foi “Pelo telefone”, por Donga. Mas o que poucos sabem é que a letra original era outra:
O chefe da folia
Pelo telefone
Mandou me avisar
Que com a alegria
Não se questione
Para se brincar
O Rio, porém, estava às voltas (aliás, como sempre está) com o combate à jogatina. Não demorou para que surgisse uma letra alternativa para a canção:
O chefe da polícia
Pelo telefone
Mandou me avisar
Que na Carioca
Tem uma roleta
Para se jogar
Um caso raro de paródia que acaba se tornando a letra oficial de uma música.
Gerson, é claro, não poderia deixar de tocar num assunto que até hoje azucrina os cariocas – assunto este pelo qual já passamos no decorrer desta série: o transporte. Se antes falamos dos motoristas dos tílburis mal-educados, agora falamos dos projetos para o transporte público, mais especificamente o metro, cujo primeiro projeto nasceu em 1911. Construído fosse, sairia da Avenida Central, hoje Rio Branco, e sua última estação seria em Cascadura. Mais projetos sobre o metrô apareceram, inclusive com propaganda com direito a stand no centro da cidade. Mas Carlos Lacerda, então governador não quis construí-lo. Pirraça? Não. É que Lacerda achava mais urgente o problema de abastecimento de água na cidade que crescia sem parar e o resolveu construindo a adutora do rio Guandu, que segundo suas palavras resolveriam esta questão até o ano 2000. Coincidência ou não, e aqui falo eu porque vivi isso, em 2001 aconteceram alguns problemas de falta d’água na cidade de São Sebastião, já resolvidos.
Eram outros tempos, sem dúvida. Hoje, fala-se num filme louvando o presidente da República que está no poder. Claro, tudo muito isento, quem pensa em culto à personalidade é um doido varrido. Mas houve época em que o Imperador abriu mão de uma estátua em sua homenagem depois da Guerra do Paraguai – cujo dinheiro nem público era – para que em seu lugar se construíssem escolas pela cidade a fora, o que de fato foi feito.
E como de tempos idos falamos, houve um tempo em que os parlamentares da cidade não ficavam discutindo sobre cotas de passagens em carruagens públicas e quejandos. Não, meus caros. Nesta época que parece nem ter existido no Rio e muito menos no Brasil, os vereadores votavam de acordo com os interesses da cidade. Debates haviam e muitos, acalorados. Mas se um projeto de lei estivesse em pauta e um vereador pudesse ser beneficiado por isso, ele se retirava do plenário para que sua presença não influísse na votação dos outros políticos.
Carlos Lacerda (de óculos, à esquerda),
inspecionando as obras da adutora do Guandu.