Quanto mais se usam dados objetivos e referências históricas em debates contaminados por emoção, partidarismo, política e ideologia, menor o risco de se cometer graves equívocos na hora de tomar decisões. No caso da proposta de instituição de cotas raciais visando à criação de uma reserva de vagas para negros no ensino superior, este cuidado é imprescindível, pois estão em jogo questõeschave: da qualificação de profissionais, imprescindível para o país poder competir no mundo globalizado, à preservação de características saudáveis na formação de uma sociedade miscigenada, como a brasileira, sem as tensões raciais verificadas, por exemplo, nos Estados Unidos.
Esta proposta, importada ainda na Era FH dentro das chamadas ações afirmativas, ganhou mais força na gestão Lula, porque, nela, a militância racialista aumentou a presença no Executivo em Brasília. Com articulações no Congresso, o lobby conseguiu fazer tramitar entre deputados e senadores uma lei específica de criação dessas cotas e um projeto de estatuto, o qual estende a reserva de mercado em função da cor da pele à publicidade, à concessão de emprego no setor público, entre outras aberrações.
Na discussão que se trava de maneira mais acesa desde o início do atual governo, já existe um rico acervo de argumentos fundamentados contra as cotas raciais, mecanismo, inclusive, já revisto pela Justiça dos Estados Unidos, onde elas surgiram e se firmaram.
Pesquisa feita pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), primeiro estabelecimento de ensino superior do país a aderir ao sistema de cotas raciais, contribui para este acervo. Realizado a partir dos dados do vestibular feito pela universidade em 2009, o levantamento comprova uma das mais cortantes críticas às cotas: criadas para supostamente corrigir injustiças, as cotas impedem a entrada no ensino superior de pessoas mais bem preparadas. É a confirmação do perigoso abandono do princípio do mérito.
Das 2.396 vagas abertas naquele vestibular para cotistas, apenas 1.384 foram preenchidas, pois os candidatos não conseguiram obter a nota mínima: 2. Mesmo que a relação entre candidatos cotistas e vagas fosse quase um para um, enquanto entre os não cotistas 11 disputaram cada vaga. Entenda-se: se não são exigidas maiores qualificações aos cotistas, muitos merecedores de entrar na universidade ficaram de fora. Ainda com base na mesma pesquisa, a Uerj tenta justificar as cotas afirmando que o índice de reprovação é maior entre os não cotistas. A constatação, no entanto, tem importância relativa, pois o dano maior, o de impedir o desenvolvimento de talentos apenas porque eles não são negros, já foi causado no vestibular.
Também não surpreende que, em várias disciplinas, cotistas tenham notas inferiores às dos demais estudantes. Até o reitor da Uerj, Ricardo Vieiralves de Castro, em entrevista ao “Jornal Nacional”, admitiu que ficam de fora estudantes mais bem preparados. Mas ele continua a defender as cotas, mesmo que haja tantas evidências de que, ao reduzir a importância do princípio do mérito em nome da “raça”, o Brasil não terá profissionais qualificados como a realidade requer e, como inadmissível subproduto, já começa a inocular o racismo no convívio cotidiano da juventude.
Que esta pesquisa ajude o Congresso e o STF, onde o tema tramita, a refletir.