quarta-feira, 9 de julho de 2008

PANTALEÃO E AS VISITADORAS, de Mario Vargas Llosa

O Comando do Exército peruano está preocupado com as notícias que vêm de suas tropas encravadas na Amazônia: seus soldados, sem mulher há muito tempo, invadem as cidades da região e estupram as moradoras, não raro, engravidando-as. É preciso tomar uma medida urgente para que a situação não se agrave.

Divididos, os generais resolvem passar a batata quente para o capitão Pantaleão Pantoja, um oficial incorruptível, eficiente e que possui uma alta capacidade de organização. Sem pestanejar, ele cria um serviço que vai desafogar a rapaziada no meio do mato: as visitadoras, um grupo de putas que vai de guarnição em guarnição, de posto de fronteira em posto de fronteira, para levar um pouco de alegria regada a sexo para os soldados desesperados.

O serviço é um sucesso. Mas, como não poderia deixar de ser, afeta a vida pessoal de Pantaleão (que se transforma no meio deste turbilhão) e começa a incomodar o próprio Exército.

Como se não bastasse, o Exército e as populações das cidades amazônicas se deparam com os fanáticos da Irmandade da Arca, capitaneadas pelo Irmão Francisco, um homem que diz receber mensagens de Deus sobre a chegada iminente do fim do mundo, e que sai, floresta a dentro, crucificando animais. E depois, pessoas.

Vargas Llosa nos conta que "Pantaleão e as visitadoras" é baseado numa história real que termina numa "farsa truculenta". Ao começar a escrever o romance o autor diz que estava "pervertido (...) pela teoria do compromisso na sua versão sartreana" e tentou levar a história a sério, mas descobriu "que ela exigia a paródia e a gargalhada. Foi uma experiência libertadora, que me revelou - só então! - as possibilidades da brincadeira e do humor na literatura."

E de fato são bem divertidos os eufemismos usados, por exemplo, pelos oficiais quando se referem aos relatórios ao Serviço das Visitadoras. É uma linguagem cheia de não-me-toques, que quer parecer impoluta, mas cai apenas no ridículo, como ridícula é, aliás, toda a situação.

Pincei um trecho onde Pantaleão revela para os oficiais o valor dos serviços prestados pelas putas em geral na região:

"(...) não é a maioria senão uma reduzida minoria de clientes que se contenta com uma prestação simples e normal (tarifa: 50 soles; duração: 15 a 20 minutos), exigindo quase todos uma série de variantes, elaborações, adendos, distorções e complicações que se encaixam no que se deu por chamar de aberrações sexuais. Que, entre a matizada gama de prestações que se oferecem, figuram da singela masturbação efetuada pela meretriz (manual: 50 soles; bucal ou 'boquete': 200) até o ato sodomista (em termos vulgares, 'foda estreita' ou 'com cocozinho': 50), o 69 (200 soles), espetáculo sáfico ou 'briga de aranhas' (200 soles cada um) (...)"

Aproveitando o embalo, há um personagem que nos remete ao Brasil-il-il de hoje. Trata-se de um radialista, conhecido como Sinchi, dono de um programa de muito sucesso na região. O Serviço das Visitadoras já estava causando certo escândalo em Iquitos (onde se passa boa parte da história), quando o radialista resolve achacar o capitão Pantaleão Pantoja em troca de elogios, para tentar apaziguar a situação junto à sociedade loretana (Loreto é o departamento onde fica Iquitos). É claro que o capitão recusa a "oferta" e Sinchi passa a desancar as visitadoras em nome da moral e dos bons costumes.

Sinchi deve ser um dos precursores do jornalismo de serviços...